Enquanto
“I can’t stop loving you”, do Ray Charles, dominava o topo das paradas de sucesso do ano de 1959, Tim Maia embarcou com 17 anos para os Estados Unidos onde teve seu primeiro contato com a
black music. A forte influência do estilo musical marcou a maneira como Tim pensava, entendia e criava suas músicas. Na década de 1970 um dos maiores sucessos do cantor, “Azul da cor do mar” era considerado uma
baião soulidificado, assim como “Primavera”.
Pai da
soul music brasileira, Tim era referência para artistas iniciantes, que buscavam no cantor um estilo a ser seguido. E não foi diferente para César Belieny, que começou a carreira na banda Nocaute, indicada como melhor álbum de
hip hop da América Latina, e escolhida para a abertura do show do síndico no Circo Voador no ano de 199X.
Em entrevista ao blog chama o síndico, César conta a grande influência do Tim e de seu estilo. Confira:
BCS: De que forma você vê o soul music /batidas americanizadas na música brasileira? CB: Com bons olhos. Acho que as variações dos gêneros de uma forma geral sofrem de mutação contínua, qualquer ritmo que tenha sido cristalizado possui sua raiz de formação. Patentear a
soul music como estritamente de origem americana é tolice. Em uma análise mais profunda do gênero encontraremos certamente vertentes da música africana.
Isso posto, as coisas acabam por se retroalimentar, visto que somos deveras influenciados pela música africana. Estilos tachados como originalmente de gênese brasileira, como o samba, possuem sua matriz na África e acabam por se reencontrar por aqui no “sambasoul”, “sambafunk”, entre outros.
BCS: Qual é a influência de Tim Maia e/ou do gênero soul na sua musica? CB: Influência total. Tive a oportunidade e o privilégio de abrir o show do Tim Maia no Circo Voador (o antigo circo). O gênero
soul acabou por formar minha linha de composição e acrescentou muito no instrumento que me projetou como instrumentista: o baixo.
Na
soul music, o baixo conduz a canção. Sempre fui fascinado pelo
groove e a maneira como se difundiu na minha infância, na baixada Fluminense. Os bailes daquela época eram com música ao vivo e a música era o
soul.
BCS: Como se dá a permanência do gênero no mercado atual? CB: Fundamentalmente ganhou ainda mais força com a ascendência do
hip hop. As batidas usadas pelos Dj’s, quase em sua totalidade, vieram dos samples dos clássicos da Motown.
Isso valorizou e trouxe para uma perspectiva contemporânea a velha guarda da
soul music, como: James Brown, Parliament, Tower of Power, entre outros. O
rap fortalece a permanência e traz de volta a essência da raiz mais uma vez. Olha mais uma a mutação contínua acontecendo!
BCS: O que existe de enriquecedor, musicalmente falando, em misturar ritmos distintos? CB: A amálgama que constrói a fusão dos ritmos encontra-se no cerne de nossa cultura brasileira miscigenada. Somos a própria mistura personificada, logo em se tratando de música, essa intrínseca consciência do ser antropofágico que devora ou é devorado nas mais diversas perspectivas colonizadoras, nos faz ricos de ritmos. Conseguimos não somente cristalizar gêneros, mas fazê-los referenciais ideológicos acompanhados de suas trilhas sonoras. Assim foi o
mangue beat de Chico Science e Nação Zumbi inserindo guitarra elétrica distorcida ao maracatu concernente ao olhar de Josué de Castro. O coco e a embolada de Jackson do pandeiro sendo incorporada ao MPB/
Pop de Lenine. A literatura de Cordel que ganha nos cantadores suas difusões. Muitas linhas e laudas poderiam ser dedicadas a um sem números de misturas ritmos peculiares desse nosso Brasil de caleidoscópio sem órbita.
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(Foto: O Globo) |
Post por Thaissa Garcia e Lucinei Acosta